Autoescolas pressionam contra fim da obrigatoriedade de aulas para CNH

O anúncio do Ministério dos Transportes de retirar a obrigatoriedade das aulas teóricas e práticas em autoescolas para obtenção da CNH provocou forte reação do setor.
Enquanto o governo argumenta que a medida pode baratear o processo e democratizar o acesso, federações, sindicatos e parlamentares alertam para perigos à segurança viária e impactos econômicos severos.
Proposta do governo para o fim das autoescolas na emissão da CNH
A proposta, apresentada pelo ministro Renan Filho, pretende tornar facultativa a formação nas autoescolas. O candidato poderia estudar sozinho, recorrer a instrutores credenciados ou seguir o método tradicional. O
governo estima que a mudança poderia reduzir em até 80% o custo médio da habilitação, que atualmente gira em torno de R$ 3,2 mil, dos quais cerca de R$ 2,5 mil vão para as autoescolas.
Segundo o secretário nacional de Trânsito, Adrualdo Catão, a medida visa promover inclusão social, oferecendo alternativas mais acessíveis para cerca de 20 milhões de brasileiros que já dirigem sem CNH e outros 30 milhões que têm interesse mas não condições financeiras.
Setor em alerta: risco à segurança e ao emprego
Em resposta, a Federação Nacional das Autoescolas (Feneauto), sindicatos estaduais como o dos CFCs de Minas Gerais, e parlamentares lideraram uma mobilização política para barrar a proposta.
Foi realizada audiência pública e, em 3 de setembro, o tema foi levado a debate em Comissão Geral da Câmara dos Deputados.
Parlamentares como Zé Silva (Solidariedade-MG) e Zé Neto (PT-BA) ressaltaram que o setor envolve cerca de 15 mil autoescolas e gera 300 mil empregos, o que não pode ser simplesmente ignorado em nome da redução de custos.
Riscos no trânsito? Entenda a possibilidade
Especialistas em trânsito e entidades como o Observatório Nacional de Segurança Viária (ONSV) afirmam que a eliminação da formação estruturada fragiliza a política de trânsito — e contraria o Plano Nacional de Redução de Mortes e Lesões no Trânsito (PNATRans).
A advogada especialista em direito de trânsito, Fernanda Zucare, também critica a proposta: “A dispensa das aulas obrigatórias pode comprometer a preparação técnica e comportamental dos futuros motoristas”, o que elevaria o risco de acidentes.
O setor enfatiza ainda que não se trata apenas de aulas, mas de formação consciente em direção defensiva e cidadania no trânsito — aspectos que, segundo educadores, dificilmente seriam mantidos fora das autoescolas.
Impactos econômicos alarmantes
Segundo cálculos do setor, a mudança colocaria em risco anualmente cerca de R$ 14 bilhões, além de provocar desemprego em massa, fechamento de empresas, especialmente em cidades do interior, e perda de arrecadação tributária.
Além disso, muitos Centros de Formação de Condutores já investiram em tecnologia, como simuladores e sistemas digitais. A proposta, temem, desincentivaria esses avanços e geraria precarização da formação.
O Sindicfc-MG (MG) propôs soluções que conciliem modernização e segurança: simplificação da burocracia, ensino híbrido (digital + presencial), revisão das avaliações, fortalecimento da fiscalização dos instrutores e redução de taxas estaduais.
Contexto histórico e precedentes
Até 1998, era possível obter CNH sem autoescola, com estudo próprio e aulas práticas informais. Mas, com a introdução do Código de Trânsito (CTB), o modelo mudou para profissionalizar e padronizar a formação.
Países como EUA, Canadá e Reino Unido têm modelos mais flexíveis, mas muitos países europeus exigem carga horária ainda maior que a brasileira — inclusive em países desenvolvidos.
Tendência: ensino digital com supervisão
Outra vertente da proposta prevê um curso teórico online gratuito via plataforma EAD da Senatran, com controle de presença, sem aula ao vivo, para reduzir custos. Quem preferir, ainda poderá fazer essa etapa em autoescolas ou Detrans.
Instrutores autônomos credenciados poderiam atuar de forma semelhante a “personal trainers”, com veículos identificados, mas sem exigir toda a estrutura física tradicional das autoescolas.
Debate aceso no Congresso
A minuta segue em consulta pública, e o governo afirma que não deseja extinguir as autoescolas, mas oferecer alternativas. Por outro lado, o setor afirma que não foi devidamente consultado.