Trabalho em Feriados e Domingos – Entenda os Limites da CLT e as Novas Diretrizes de 2025

O debate sobre o trabalho aos domingos e feriados no Brasil envolve diversos pilares da legislação trabalhista, da CLT à Lei nº 10.101/2000, e na prática se traduz em tensões entre direito ao descanso, dinamismo do comércio e convenções coletivas.
Em 2025, importantes mudanças entram em vigor, por meio da Portaria nº 3.665/2023, com impactos significativos na rotina de empresas e trabalhadores.
O objetivo deste texto é esclarecer o que diz a legislação atual, como funciona na prática, e quais serão os efeitos das alterações a partir de 1º de julho de 2025.
2. O que a legislação atual estabelece (até junho de 2025)
2.1 Norma principal: CLT e descanso semanal remunerado
Desde seu artigo 67, a CLT estabelece a obrigação do descanso semanal remunerado — preferencialmente aos domingos — e, em feriados, admite-se jornada somente em atividades autorizadas por lei, com compensação via pagamento adicional ou folga. O descanso semanal remunerado já garantia o direito ao repouso de 24 horas consecutivas.
2.2 Lei nº 10.101/2000 e Lei nº 11.603/2007 (comércio em feriados)
A Lei nº 10.101 estabeleceu que o comércio só poderia funcionar em feriados mediante convenção coletiva, observadas eventuais normas municipais.
Esta exigência era clara, mas uma portaria editada em 2021 (Portaria nº 671/2021) permitiu o funcionamento sem esse instrumento coletivo — uma contradição que foi contestada como ilegal, pois portaria não pode se sobrepor à lei.
2.3 Situações permitidas atualmente
Estão autorizados a operar aos domingos e feriados, independentemente de convenção coletiva, setores como saúde, transporte, hotelaria, segurança, turismo, comunicação, entre outros.
Já outras atividades, especialmente no comércio varejista, precisavam de acordo coletivo ou baseavam-se na portaria de 2021, que agora perde vigência.
2.4 Direitos do trabalhador
Pagamento em dobro ou folga compensatória, conforme CLT e entendimento do TST.
Folga compensatória deve ser concedida preferencialmente dentro da semana seguinte.
O adicional por horas trabalhadas em feriados/domingo é de no mínimo 100% sobre a hora normal.
A escala de revezamento garante pelo menos um domingo de descanso a cada sete semanas.
3. A portaria de 2021 e seu impacto prático
A Portaria nº 671/2021, editada durante o governo anterior, estabeleceu permissão genérica ao comércio para funcionar em feriados sem necessidade de acordo coletivo.
Essa norma ficou em vigor até meados de 2025, na prática liberando muitos estabelecimentos a operar em datas festivas, mesmo sem instrumentos coletivos firmados. Essa liberalização ocasionou questionamentos sobre a legalidade da medida.
4. A Portaria nº 3.665/2023 e suas alterações
Publicada em novembro de 2023, mas com entrada em vigor planejada, a Portaria nº 3.665/2023 retoma o entendimento legal de que o trabalho em feriados e domingos só pode ocorrer com acordo coletivo ou convenção. As principais regras são:
Negociação coletiva obrigatória para escalar funcionários em feriados ou domingos, salvo exceções por lei ou regulamentação municipal, especialmente nos setores já autorizados permanentemente.
Exceções mantidas: saúde, segurança, transporte, turismo, hotelaria, entre outros, continuam liberados.
Compensação constante: hora em dobro ou folga substitutiva, conforme CLT.
Transparência e formalização: os termos da negociação devem estar documentados e disponíveis para fiscalização.
5. Cronologia e prorrogações
Portaria publicada em novembro de 2023.
Início previsto: inicialmente 1º de julho de 2025.
Posteriormente, houve prorrogação até 1º de março de 2026, conforme novo anúncio do MTE em junho de 2025, permitindo mais tempo de adaptação para sindicatos e empresas.
6. O que muda em 2025 (12 meses após a medida)
6.1 Fim da autorização tácita
Após a data-limite, as empresas que exploravam brechas da portaria de 2021 não poderão mais operar em feriados/domingo sem acordo. A atividade só será legal se houver convenção coletiva formalizada.
6.2 Reforço do papel sindical
As negociações coletivas deixam de ser facultativas e se tornam requisito legal. Empresas deverão iniciar tratativas com antecedência e registrar instrumentos de acordos ou convenções .
6.3 Setores essenciais continuam
Serviços considerados essenciais, como saúde, transporte, imprensa, segurança, fornecimento de água e energia, permanecem com autorização contínua . Municípios com legislação específica (zonas turísticas, por exemplo) podem legitimar funcionamento mediante lei local .
6.4 Sanções previstas
Descumprimentos — como exigir trabalho sem acordo ou não pagar adicional/folga — geram risco de multa trabalhista e ação fiscalizadora.
7. Impactos práticos
7.1 Empresas e empregadores
Planejamento antecipado: devem iniciar negociação coletiva meses antes das datas festivas.
Revisão de escalas e contratos: obrigatoriedade de cláusulas que prevejam trabalho em fim de semana/feriado via acordo.
Custo operacional: se não houver acordo, precisa pagar em dobro ou conceder folga.
Risco de punição: atos sem respaldo coletivo acarretam autos e multas.
7.2 Trabalhadores
Mais segurança jurídica: decisão coletiva reduz imposição arbitrária de trabalho em feriados.
Maior transparência monetária: acordo pode prever pagamento maior ou folgas.
Controle do descanso semanal: contagem de domingos e feriados dentro de escalas de revezamento.
7.3 Setores essenciais e municípios
Manutenção de serviços: exceções permanecem válidas.
Acordos legais locais: municípios podem ampliar ou restringir abertura de comércio em datas específicas.
8. Visão crítica
A Portaria de 2023 corrige um desajuste institucional ao restabelecer a necessidade de negociação prevista em lei, fortalecendo os sindicatos e homologando a autonomia coletiva.
Contudo, a prorrogação até 2026 reflete a dificuldade prática no agendamento dessas tratativas, ainda incipientes em muitas categorias ou regiões.
Mantém-se o dilema: preservar o direito ao descanso vs. assegurar dinamismo econômico em datas de alto movimento.
A saída negociada tende a gerar acordos equilibrados, mas pode resultar em entraves administrativos para pequenas empresas e comerciantes, especialmente em cidades sem apoio sindical estruturado. Além disso, as convenções coletivas podem mesmo se transformarem em instrumentos de aumento de custos.
9. O que esperar nos próximos meses
Campanhas de informações: sindicatos e MTE devem intensificar campanhas sobre o novo marco positivo e instrumentos legais.
Negociações estratégicas: empresas, sobretudo médias e grandes, se mobilizam para construir agendas coletivas antes de julho de 2025 (ou março de 2026, em caso de prorrogação).
Foco em instrumentos flexíveis: adoção de banco de horas, folgas rotativas, escalas 4×3 para ajustar demandas esporádicas.
Fiscalização intensificada: caminhadas do MTE e auditorias regionais devem garantir cumprimento da regra.