Mudanças à vista no BPC? Simone Tebet levanta discussão sobre regras

A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, defendeu nesta semana uma revisão das regras do Benefício de Prestação Continuada (BPC).

A proposta, segundo a ministra, tem como objetivo tornar o programa mais justo e eficiente, alcançando quem realmente precisa da assistência pública e contribuindo para a sustentabilidade das contas públicas.

Mudanças à vista no BPC? Simone Tebet levanta discussão sobre regras. Foto: Reprodução

A declaração foi feita durante audiência na Comissão Mista de Orçamento (CMO) do Congresso Nacional, onde a ministra apresentou o Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias do 2º bimestre.

O encontro serviu para discutir a execução orçamentária do governo federal e os desafios fiscais diante do aumento dos gastos sociais, com destaque para o BPC, cujo impacto sobre o orçamento preocupa a equipe econômica.

Crescimento do BPC pressiona o Orçamento

O BPC é um benefício assistencial garantido pela Constituição e regulamentado pela Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS).

Ele assegura um salário mínimo mensal a idosos com 65 anos ou mais e a pessoas com deficiência de qualquer idade, desde que comprovem baixa renda familiar.

Nos últimos anos, o número de beneficiários cresceu de forma expressiva. Atualmente, são mais de 5 milhões de pessoas atendidas pelo programa.

Para 2025, estima-se que o BPC consumirá cerca de R$ 100 bilhões do orçamento público, valor superior ao previsto para diversas áreas estratégicas como infraestrutura e segurança pública.

Simone Tebet alertou para a dificuldade de continuar financiando o benefício sem uma revisão criteriosa. “O BPC é um direito constitucional, mas precisamos discutir seus critérios para garantir que ele chegue a quem realmente necessita. Há distorções que precisam ser corrigidas”, afirmou a ministra.

Distorções e falta de focalização

Uma das principais preocupações da equipe econômica é a falta de focalização do benefício. A regra atual considera que a renda per capita familiar deve ser inferior a 1/4 do salário mínimo para ter direito ao BPC.

No entanto, decisões judiciais, flexibilizações e interpretações administrativas têm ampliado o acesso, gerando dúvidas sobre a real situação de vulnerabilidade de parte dos beneficiários.

“Estamos discutindo um redesenho do programa. A ideia não é retirar direitos, mas aprimorar a gestão e aplicar os recursos de forma mais justa”, explicou Tebet, ao ser questionada por parlamentares sobre possíveis cortes.

A ministra também defendeu o uso de tecnologias para melhorar a identificação de beneficiários, como o cruzamento de dados com outras bases do governo, como Receita Federal, CadÚnico e CNIS (Cadastro Nacional de Informações Sociais).

Segundo especialistas do governo, há casos em que famílias recebem o BPC e, ao mesmo tempo, contam com rendas formais ou informais não declaradas, o que descaracteriza a situação de vulnerabilidade extrema exigida pelo programa. “A lógica é: quanto melhor a focalização, maior o espaço para inclusão de quem ainda está de fora”, justificou a ministra.

Propostas em estudo

O governo ainda não apresentou uma proposta formal de mudança nas regras do BPC, mas Simone Tebet adiantou que existem estudos técnicos em andamento para reformular os critérios de acesso e permanência no programa. Entre as propostas que vêm sendo analisadas estão:

  • Revisão do critério de renda per capita, com possível ampliação de faixas e criação de pontuação que leve em conta outros fatores além da renda, como condições de moradia, despesas médicas e grau de dependência.

  • Incorporação de um mecanismo de “porta de saída”, especialmente para pessoas com deficiência em idade ativa, que poderiam ser incluídas em programas de qualificação e inserção no mercado de trabalho, sem o risco de perder imediatamente o benefício.

  • Melhoria na integração entre o BPC e o Cadastro Único, com atualizações automáticas de dados e maior rigor na verificação de informações.

  • Criação de um comitê interministerial para avaliar periodicamente o perfil dos beneficiários e propor ajustes com base em evidências.

Tebet também sugeriu que qualquer proposta seja amplamente discutida com o Congresso Nacional e com a sociedade civil, especialmente entidades que representam pessoas com deficiência e idosos.

“Não queremos impor nada de cima para baixo. Precisamos de diálogo, escuta e responsabilidade”, frisou.

Reações no Congresso

A fala da ministra gerou reações divergentes entre os parlamentares. Alguns deputados e senadores apoiaram a ideia de revisar as regras do BPC, desde que a mudança resulte em maior justiça social e não em exclusão de pessoas em situação de vulnerabilidade.

A senadora Eliziane Gama (PSD-MA), por exemplo, elogiou a disposição do governo em enfrentar a questão com responsabilidade fiscal. “É necessário que o Estado atue com sensibilidade, mas também com racionalidade. A má alocação de recursos públicos prejudica justamente quem mais precisa”, afirmou.

Já o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) manifestou preocupação com uma possível redução do alcance do benefício.

“A história nos mostra que quando se fala em ‘revisão de regras’, na prática, há risco de cortes. Precisamos garantir que ninguém em situação de pobreza extrema seja deixado para trás”, alertou.

O debate também repercutiu entre entidades da sociedade civil. O Fórum Nacional das Entidades da Pessoa com Deficiência divulgou nota pedindo que qualquer revisão seja feita com ampla participação social e garantia dos direitos já conquistados.

Impacto social do BPC

Apesar das críticas, há consenso sobre a importância do BPC como instrumento de combate à pobreza e de promoção da dignidade para idosos e pessoas com deficiência.

O benefício é muitas vezes a única fonte de renda de famílias inteiras, especialmente nas regiões Norte e Nordeste.

Estudos apontam que o BPC tem impacto direto na redução das desigualdades e no acesso a serviços básicos, como saúde e alimentação. “Não podemos tratar esse tema apenas sob a ótica fiscal. O BPC é uma política estruturante, que salva vidas todos os dias”, destacou a deputada Erika Kokay (PT-DF).

Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), o BPC tem contribuído para reduzir a taxa de pobreza entre idosos para menos de 1% e é fundamental para o bem-estar de mais de 2,6 milhões de pessoas com deficiência.

Próximos passos

A expectativa é de que o governo federal apresente uma proposta formal de atualização das regras do BPC até o fim do segundo semestre de 2025. A medida deverá passar por debates técnicos, audiências públicas e análise legislativa no Congresso Nacional.

Para Simone Tebet, o momento exige coragem para enfrentar os desafios estruturais da assistência social. “Precisamos garantir sustentabilidade para que o BPC continue sendo um pilar da nossa rede de proteção. Mas para isso, é necessário melhorar a gestão, combater fraudes e ajustar as regras à realidade brasileira”, concluiu.

Enquanto isso, a Comissão Mista de Orçamento promete acompanhar de perto as discussões e cobrar transparência em todas as etapas do processo.

A presidente da CMO, senadora Daniella Ribeiro (PSD-PB), defendeu a criação de um grupo de trabalho conjunto com o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social para aprofundar o debate.

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